quarta-feira, 17 de julho de 2013

O velho

Sentada no chão gelado da sacada, Violeta observava os apartamentos acesos do prédio em frente. Entre pessoas assistindo televisão, uma cena lhe fez parar. Um senhor – era possível perceber que não era um garoto pela cabeça branca – era o único em pé, no centro de uma roda de cinco pessoas sentadas. Um ritual satânico? “Imagem e Ação”? Um cara como o tio Armando, que gosta de atenção exclusiva pra si e seus lamentos raivosos? Só ao notar os aplausos e o baralho percebeu. O velho era mágico. Terça-feira, 19 horas e 48 minutos, e o velho apresentava um truque àquelas pessoas.

Perguntou-se quão apaixonado seria o velho por seu baralho e o espanto que causa. “Admiro quem sabe o que quer fazer da vida”, pensou, antes de esticar os braços atrás da cabeça e tentar aconchegar-se na porta de vidro. De olhos fechados, imaginou o velho com 1,43 metros de altura, usando uma cartola preta e uma capa. Juntando dinheiro para cursos. Animando festas. Reclamando do Mister M.

Olhando o velho, Violeta soube. E, antes de ficar feliz, relutou. Relutou por que sempre soube. Aquela voz tímida, quase rouca, que dentro dela sempre repetiu o mesmo. Sempre relutou. Sempre desistiu. “Eu admiro quem sabe o que quer da vida e, de fato, faz”.