quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Ana aos 28


Somente no momento em que repousou um bichinho de pelúcia dentro da última caixa de papelão Ana se deu conta de que nem sabe por que, de fato, deixará a casa dos pais. Olhou ao redor e sentiu vontade de ouvir todos os CDs antigos, reler os livros infantis e abraçar as lembranças.

Após 28 anos de filosofia, questionamento e inconsequência, tentando descobrir quem realmente é e qual seu objetivo na vida, não encontrou nenhuma resposta que durasse mais de 24 horas. Repentinamente, foi tomada pelo medo de nunca ter realizado nada que proporcionasse o bem, nada que a impulsionasse até o lugar em que queria chegar, afinal, como chegar sem o endereço? Assim como Alice em seu país das maravilhas, podia ouvir o Gato de Cheshire a lhe responder: "nesse caso, pouco importa o caminho que sigas"...

Enquanto decidia se levava algumas fotos ou ateava fogo nas mesmas, avaliou atitudes das quais ora se envergonha, ora se orgulha. Existe uma Ana descabelada e impulsiva que bate à porta após algumas doses de álcool e não se dá muito bem com a Ana cara de terça-feira, ainda um pouco descabelada, porém preocupada com o trabalho e com o sentimento alheio. A primeira não pensa em nada que não faça parte do segundo vivido no tempo presente. Isso prejudica a terça-feira, mas tem o poder de transformar banalidades em momentos saborosos e inesquecíveis.

“Ana terça-feira” estudou Psicologia, até descobrir que sabia pintar quadros a óleo e mudar para Biologia, por que a tinta acabou. A outra Ana só quer saber de música, gente divertida, um bom vinho e um papo sobre a vida. A Biologia que se foda.

Se Ana não pensasse tanto, acharia normal a quantidade de variáveis e mudanças bruscas pelas quais passa. Se esbalda na espontaneidade, mas sofre na terça. Depois se sente culpada pelo desejo de voltar... Não sabe quem é, o que quer, para onde vai, de onde veio, muito menos aonde quer chegar. Não tem certeza se sente prazer por isso ou se quer se matar. Não consegue escolher entre pudim ou papaia para o jantar. Em plena terça-feira decidiu tomar uma decisão. Ligou o fusca verde, colocou as caixas no banco traseiro, o som no último e se permitiu não questionar mais.

3 comentários:

  1. Desconhecia seu blog, gostei muito do texto! O exercício de se permitir não questionar é diário aos questionadores.
    Aguardo mais publicações prima.
    Beijos

    ResponderExcluir
  2. e tem muita terça-feira durante os dias da semana, hein?!

    ResponderExcluir