terça-feira, 13 de novembro de 2012

As libras de Társio


Társio nunca precisou se preocupar com ninguém, tão pouco com opiniões e desejos alheios. Na escola costumava se distrair desenhando, sozinho. Durante a adolescência tomou gosto por tocar violão e assistir filmes de ficção, sozinho. Adulto, escolheu o cigarro e a mesa de bar. Sim, sozinho.

Nunca teve amizades que durassem mais de algumas horas banhadas em álcool, acreditava que as pessoas não passavam de pedaços de carne ambulantes que, por um acaso, falam. Tédio. Desnecessário.

A única coisa que lhe dava forças para trabalhar todos os dias era o desejo de viajar. Preferia conhecer os prédios, ruas, postes e objetos do que qualquer ser vivo. Após dois anos vivendo de forma robótica, guardar dinheiro foi fácil. Seus gastos se davam, basicamente, com cigarro, cerveja, pão e queijo.

Assim que pousou em Londres começou a busca pelo contato de uma prostituta. Apenas colocou a mochila nas costas e perambulou pelas ruas, com o único objetivo de fazer sexo mecânico com uma desconhecida. Isso não se tratava de uma rebeldia ou ato de libertação de mochileiro, mas sim um costume, sempre que o lado animal e humano de Társio superava seu controle racional e matemático. Encontrava uma prostituta barata e silenciosa, determinava sua velha conhecida posição que fazia com que atingisse o orgasmo com a rapidez de uma bala, pagava e cochilava nos minutos restantes que sobravam de crédito. Fim.

Era noite e a cidade tinha cara de festa, então suspeitou que não encontraria grandes dificuldades em atingir seu objetivo. Entrou em um pub pequeno e mal cheiroso, até mesmo para ele, que sempre fedia tabaco e ralo de pia.

Já não enxergava bem no momento em que viu aquela mulher, extremamente pálida e com dentes cor de asfalto, cair no chão ao tentar se debruçar em um grupo de homens, que riram com a queda. Os cabelos curtos estavam molhados pela mesma bebida colorida que manchara seu vestido. Com um salto quebrado, ela não tentou se levantar, apenas pediu mais uma bebida, apoiou as costas na parede e esticou as pernas para frente. Társio imaginou o quanto ela cobraria, sendo tão feia e suja. Tentou reverter o valor em libras enquanto puxava-a pelo braço e a levava embora daquele lugar.

Ela não falava inglês. Imaginou que se tratava de uma estudante de qualquer país vizinho, tanto faz. Perguntou se o pagamento poderia ser realizado em libras, ela fez sinal afirmativo com a cabeça.

Depois disso, lembra de flashes da busca por um beco sem saída, albergue ou qualquer coisa similar. Cama beliche, vozes, risadas, cigarros. Risadas ou gritos? Sei lá. Ao acordar e projetar sua mão direita para coçar as partes baixas, encontrou algumas notas dentro da cueca. 20 libras no total. Não se lembrava de ter guardado nada ali, nem de ter dado dinheiro àquela mulher.

Sentiu vontade de ir embora. Enquanto contava moedas para pagar o pernoite, foi interrompido pelo rapaz que fechava sua conta na recepção, que perguntou se ele gostaria de deixar seu telefone para contato. Társio respondeu, friamente, que não tinha um número em Londres. "Sem problemas! Você costuma agendar os programas por e-mail? Helena me contou sobre seu maravilhoso trabalho e eu gostaria de saber se você está livre esta noite".

Helena estava satisfeita por ter transado com alguém tão barato na noite anterior. Se lembrou da data em que, como comemoração ao atingir a maioridade, seu pai a levou até a zona da cidade pela primeira vez e deixou que escolhesse o homem que quisesse alugar aquela noite.

Társio lembrava um vagabundo que ela comeu na França, ou foi aquele da Bélgica? Tanto faz. Mandou um e-mail para o pai contando que já havia atingido o número de 18 transas durante sua viagem. Poucos minutos depois recebeu a resposta. "Essa é a minha garota! Pegadora. Aproveite, mas não se esqueça de ficar de olho no seu irmão, que está muito saidinho para o meu gosto. Não deixe nenhuma marmanja folgada encostar nele, ok? Um beijo, papai. PS: lembre-se de usar as camisinhas que coloquei no bolso da sua mochila!"

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